14ª Bienal do Mercosul transforma fachada do Museu do Trabalho em arte

Mesmo com as portas fechadas, o museu leva a cultura para a rua mais antiga de Porto Alegre

O Museu do Trabalho abriga a obra Passatempo, da artista gaúcha Rochelle Costi (1961-2022). Originalmente exposta no interior do local em 2018, a peça artística retorna agora como parte da 14ª edição da Bienal do Mercosul, que teve início no último dia 27 de março em Porto Alegre. Com o tema “Estalo”, a exposição propõe reflexões sobre as transformações do cotidiano. 

Fechado há quase um ano devido às enchentes de maio de 2024 no Rio Grande do Sul, o museu recebe a obra de arte de maneira inusitada: do lado de fora do prédio. A fachada central do edifício exibe um grande relógio cujos números foram substituídos por letras que formam a palavra “passatempo”. O ponteiro do relógio é um taco de sinuca feito de PVC que gira às vezes no sentido horário e às vezes no sentido contrário, enquanto o motor que movimenta a peça foi adaptado de um micro-ondas. Simples e intrigante, a obra reflete uma metáfora visual sobre a passagem do tempo e a memória. 

Para Zero Costi Martín, filhe da artista que veio de São Paulo prestigiar a obra da mãe na inauguração da exposição, a decisão do curador da Bienal deste ano, Raphael Fonseca, de manter a obra em seu espaço original, ainda que do lado de fora, foi um gesto sensível. “Agora, a gente tem esse trabalho relacionado à vida comum. Nem todo mundo entra em museus para ver exposições. Nem todo mundo conhece o trabalho da minha mãe. Mas agora essa obra está ali, na rua, no cotidiano das pessoas. Acho isso muito significativo porque era justamente onde a pesquisa e o trabalho da minha mãe se movimentavam”, diz.

Apesar da potência simbólica sobre a passagem do tempo, a presença da obra no local também é um lembrete do abandono do Museu do Trabalho. Flavio Barbosa, morador da região, lamenta: “A decadência é violenta. Moro aqui na frente há dois anos e conto nos dedos os dias em que vi alguma movimentação”. Já Raquel Bittencourt, que estava fazendo o roteiro de visitação aos museus da Bienal com sua filha no último sábado (5/4), revelou a surpresa em encontrar a obra na fachada: “É diferente, né, até me perguntei se a entrada do museu era pelo outro lado”.

Apesar da Bienal ser um grande atrativo cultural para a capital gaúcha, a obra “Passatempo” passa quase despercebida por pedestres. – LAURA DRIEMEIER/BETA REDAÇÃO

A instalação de Passatempo na fachada do Museu do Trabalho já estava nos planos de Raphael Fonseca. “Ela já estava prevista para ser mostrada ali na frente”, afirma Hugo Gusmão, curador do museu. Segundo ele, outra exposição também estava escalada para ser exposta no interior do espaço nesta edição da Bienal, mas acabou sendo cancelada devido aos danos estruturais causados pelas enchentes.

O museu ainda não tem previsão de reabertura. Segundo Gusmão, será necessário reformar estruturalmente os quatro galpões que compõem o espaço. O projeto de reforma prevê a recuperação da estrutura e uma reconfiguração dos ambientes internos. “Já conseguimos a aprovação na Lei Rouanet, e agora o projeto está em fase de captação de recursos”, explica.

Localizado no Centro Histórico de Porto Alegre, o Museu do Trabalho foi atingido pelas enchentes de maio de 2024. Depois de um ano, o local ainda possui vestígios da inundação. – LAURA DRIEMEIER/BETA REDAÇÃO

Mesmo com as portas fechadas e sem previsão de reabertura, o Museu do Trabalho segue ativo e presente na cena cultural da capital gaúcha. “Por ora, vamos continuar realizando atividades fora de sua sede, em parceria com outras instituições. Como a que está agora em cartaz no South Summit 2025, uma pequena mostra da nossa coleção de gravuras e fotografias”, conta o curador do museu.

Enquanto isso, Passatempo ocupará a fachada do local até o final da 14ª Bienal do Mercosul, em junho.

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